Ela é mais nova do que eu por uma década. Possuía a inocência típica da idade e morava junto com a mãe. Quando saímos juntos pela primeira vez ela pensou que eu fosse homossexual por não ir direto para a cama. Tive então de lhe explicar os meus gostos e as minhas fantasias. Ela entendeu rápido e achou tudo muito divertido. Perguntou se poderia me dar um tapa e respondi timidamente que sim. Ela não o deu, mas, minuto e pouco depois, estava sob minhas costas me arranhando a carne com gosto como uma mulher leopardo ao abocanhar o maior boi. Suas unhas dilaceravam a carne e logo meu sangue saia vivo do corpo já dormente. Eu não dera um único pio e ela percebera a veracidade das minhas palavras. Confessei então que os pés eram as partes do corpo feminino pelas quais eu mais me sentia atraído. Ela pouco acreditou, mas aceitou o desafio. Assumiu um ar autoritário que eu sabia ser natural dela, mas que jamais havia presenciado durante uma cena erótica. Ordenou-me que deitasse no chão aos seus sapatos e colocou um pé sobre minha barriga, forçando-me contra o chão duro e frio. Suportei o peso e com a confiança adquirida naquele pouco intervalo de tempo ela subiu com os dois pés na minha barriga. O salto de quase dez centímetros enforcava-me a camiseta por cima de meu tórax e, firme, eu agüentava a humilhação sem reclamar. Eu a mirava e o olhar cruel e firme que ela me lançava me acordavam do sonho maravilhoso para a realidade espantosa de uma submissão já declarada. Ela deslocou os sapatos até meu peito e a dor de servir-lhe como tapete era denunciada pelas minhas veias dilatadas. Contudo, como um bom servo e adorando a realidade recém criada, não soltei gemido algum de dor. Estava entregue! Então a bela moça que outrora fora minha vizinha rápida como um raio agachou-se e me deu um tapa no rosto. Hoje, revendo a cena com cuidado, percebo que dada a circunstancia aquele tapa era tudo o que eu queria e um grande sonho. Ela parecia ler meus pensamentos antes mesmo de eu formulá-los e, talvez por não esperar uma atitude daquelas, doeu mais do que eu pudesse imaginar. Uma sensação indescritível de dor, prazer e humilhação, como ondas sucessivas de pudor num orgasmo tântrico. Eu sentia-a retirar as fivelas dos sapatos e logo eles eram chutados para além do meu rosto, deixando pelo caminho um rastro afrodisíaco de perfume de seus pés, um perfume adocicado com leve cheiro de couro. Eu já não era apenas um menino e ela já não era minha antiga vizinha, aquela menina querida que eu elogiava ao vê-la aos domingos em vésperas de ir à missa. Eu gozava seco, sem ejaculação. Meu olhar se fixou ao dela que ia de feroz a risonho e me atraia com a volúpia de um furacão. Senti-me amarrado, subjugado e derrotado, como um prisioneiro de guerra ao ter os membros amputados. Foi então que vi, com um espasmo de alegria e medo, a sola rosada de seu pé vindo em encontro ao meu rosto. Pude admirar a sola rosada, os dedos macios, as poucas sujeiras de um chão empoeirado e o desenho da sola como ela é, tudo num espaço de segundo, no qual seu pé submergia inexorável em direção ao meu rosto. O calcanhar esmagou-me o queixo e impediu-me de falar qualquer coisa. A sola macia quase me sufocou achatando o meu nariz e os dedos largos esparramavam-se em minha testa, num momento de maior agonia e prazer que eu tivera com ela. Pela lateral de seu pé e com meus olhos semi-cobertos pude visualizar seus olhos fixos nos meus. Senti o balanço natural de seu corpo e compreendi a transferência de seu peso de meu peito para o meu rosto. Não pude deixar de soltar em leve gemido de dor. Ela riu. “Dói?”, perguntou-me. Não respondi de imediato. Estava em êxtase, sem reação. Consegui com dificuldade soprar um fraco mas audível “não” por entre meus lábios achatados. Foi apenas um sussurro, como ao ouvido de uma amante. A mulher balançou-se graciosa sobre minha face e deu um leve pulinho para melhor se acomodar sob seu novo tapete. Uma onda de dor real e cruel assolou-me quando me vi gemendo novamente por tê-la presenciado pular meu rosto. Ela apenas riu inocentemente e me virou o rosto num ângulo de 45º ao chão, de modo que pisou parcialmente em minha face e no lado de meu rosto. Sem dó algum subiu com os dois pés sob meu rosto já rubro e empoeirado. Senti os mesmo movimentos que outrora havia deslumbrado ao vê-la, ainda na infância, numa apresentação escolar de balé. O peso do corpo sendo empurrado para a parte frontal dos pés e senti-a me pisoteando ora a face ora a bochecha. Seus dedos giravam num mesmo ponto queimando-me a carne, como um pedaço de madeira ao esfregar gradativa e uniforme um pouco de terra, criando o fogo e aquecendo o ambiente. Ela dançava sob meu rosto sem melodia alguma ao fundo, fazia-me de tablado para seus pés e obrigava-me a beijá-los de vez em quando. Então parou. Cansou. Deitou-me num ângulo reto de 90º e ergueu-se com ambos os pés sob a lateral de meu rosto, achatando com seu calcanhar a minha bochecha, fazendo-me ter dores no maxilar e urrar internamente sem, contudo, exalar sinal de dor qualquer. As solas macias esfregaram a minha orelha e um clarão de luz acendeu-se no momento em que sentia a dor de ter a frágil cartilagem do sistema auditivo sendo subitamente amassada. Um gemido mais forte de dor ascendeu-me para a realidade acima da fantasia que eu tivera. “Doeu?”, ela quis saber. “Sim”, lhe respondi, quase como uma súplica chorada. “Então porque você me deixa fazer isso com você?”, me perguntou com sua voz normal, espontânea. A voz que me domou quando eu era adolescente. As palavras de sua pergunta circulavam meu cérebro como um rodamoinho ao estraçalhar um barquinho de madeira e a resposta que eu lhe dei não poderia ser mais óbvio possível. “Porque sou seu escravo e mereço sentir a dor da carne e do espírito”. Ela então não fez mais perguntas. Voltou a esmagar meu peito e me permitiu engolir sorvos de ar fresco. Deu um riso meigo e me ordenou que eu pegasse seus calçados e recolocasse-os em vossos pés. Eu assim o fiz, ansioso para sentir a carne novamente dilacerada por aquele salto espetacular. Então ela percebeu ao encarar meu olhar que o meu sonho real era voltar para debaixo de seus pés. “Você ainda quer mais?”, perguntou-me ao sentar na cadeira com suas pernas cruzadas, pernas torneadas pelo sol de verão. A doce voz que saia de sua boca me lembrava a melodia de um belo filme romântico que assistira em meus tempos de faculdade. Não era uma voz fraca, tampouco forte. Era voz de mulher, graciosa, firme, temperamental. Poderia se tornar escandalosa e autoritária com muito pouco, mas jamais perderia o timbre que eu mais amava. Era elegante. “Sim, eu desejo me perder abaixo de teus pés, afinal, não sou mais do que vosso escravo”, lhe respondi com o rabo entre as pernas e o olhar cabisbaixo. Meus olhos estavam enlouquecidos e só olhavam os pés dela, as curvas das solinhas macias que eu aguardava beijar mais. Senti o meu corpo sendo dirigido ao chão por ela mesma, seus braços e suas mãos a tocarem os meus cabelos. Então percebi a tristeza em seus olhos. Uma dor forte chegou ao meu coração no momento em que ouvi dela com a voz embargada pelas lágrimas que caiam de seu rosto um remoto desejo que ela tivera em seus tempos escolares. “Eu jamais esperaria te ver aqui, debaixo dos meus pés, como um escravo. Eu te amei, sabe. Realmente te amei! Infelizmente você nunca percebeu e, para o meu desespero, hoje vejo que a única forma de te ter mais perto do meu sexo é te colocar como meu escravo. Desculpe-me se eu for muito má, mas tentarei ao máximo te alegrar. Ao menos uma vez na vida.” Eu estava desligado. Aquela declaração de tantos anos me fez chegar ao delírio de tentar erguer-me e fugir. Eu jamais havia visto-a como mulher. Ela sempre tinha sido uma amiga, um porto seguro aonde eu pudesse colocar minha cabeça e chorar as mágoas. Uma tristeza de comoção inimaginável aflorou-me pelo corpo e senti um vazio muito grande em meu espírito. Meus olhos pareciam ter perdido a força e olhavam sem gozo nem emoção a sola suja de sua sandália que brevemente aproximava-se de meu rosto. Ouvi ao fundo um “Lambe a sola! Deixa ela limpa!”, mas sequer tinha coragem de tentar falar-lhe. Estava estático. A bota esmagava-me a boca e com um pensamento automático, desprovido de emoção, comecei a lamber-lhe as solas, engolir a sujeira e sentir o amargo gosto da derrota. Não me importava mais engolir sujeiras de solas ou jantares franceses. Um aroma de perda se formara em minha boca e meus olhos logo ficaram lacrimosos, como o orvalho de várias árvores pela manhã após um forte vendaval. Ela trocou o sapato e eu continuei a minha limpeza. Ousei um rápido olhar para seus olhos. Seu rosto estava voltado para a minha face, mas, uma triste pena, seus olhos fechados eclodiam em lágrimas ao tempo exato em que eu era submisso a limpar seus sapatos. Fiquei por algum tempo assim. “Quer que eu te pise?”, me perguntou. Eu respondi automaticamente. “Sim”. Ela retirou novamente os sapatos e ergueu-se sob meu peito. Eu nem a sentia direito, tal era a dor que constrangia meu coração. Eu sabia que não poderia mais ficar ao seu lado, não agora que ela era casada e mãe de dois filhos. Ela casara cedo e nossos encontros se prolongaram por quase uma década. Mas este seria o último. E ela também sabia disso. O corpo escultural e moreno, os pés 36, o olhar forte e o carinho arrojado jamais seriam meus novamente. Ela andou sobre meu corpo, desfrutou de seu tapete pela última vez, derramando-me suas lágrimas repletas de emoção. Como num relâmpago instantâneo e veloz, subiu em meu sexo e me fez gemer altivamente, suas solas em contato com o quase orgasmo que eu tivera por diversas vezes em seus mesmos pés cheirosos e maravilhosos. Então desceu. Calçou sorrateira os sapatos, agachou-me ao meu lado e me beijou com fervor. Um único beijo, um devaneio amoroso jamais realizado. Com um triste olhar pegou as chaves do carro e fechou a porta do quarto. Meu corpo destruído ainda sentia a tristeza e a falta de emoção daquele momento inesquecível. Engoli em seco e fechei meus olhos. Chorei. As feridas da carne começavam a sarar. Fiquei estático, deitado ao lado da cama. O sol aos poucos deu espaço para a sua irmã mais nova, a lua e, com o passar das horas, o brilho das estrelas em meu rosto me permitiu uma breve alucinação de que tudo fora apenas um devaneio. Então, com uma amarga sensação de derrota no peito, adormeci, no chão do motel, esperando não mais acordar, nem sofrer. Apenas esperei. Eu havia adormecido.
sábado, 27 de março de 2010
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